domingo, 7 de setembro de 2008

TEXTOS HUMORÍSTICOS


(QUINO, 2000, p.154)


Os textos humorísticos são manifestações sociais que possuem aspectos lingüísticos específicos, capazes de provocar o efeito do humor. Freqüentemente estes textos estão baseados em estereótipos, e quase sempre veiculam discursos proibidos, ambíguos, não-oficiais, que, provavelmente, não se manifestariam em uma entrevista, por exemplo.

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Os sujeitos envolvidos no discurso humorístico são marcados pela heterogeneidade; e as piadas, por serem discursos, sempre servem a uma ideologia. As piadas independem da autoria pois, geralmente não tem autor. A possibilidade de uma leitura sem se considerar o autor demonstra que há discursos que se dizem, ou que são ditos por todos, dadas certas condições, sem que sua origem esteja relacionada a um indivíduo de forma relevante.
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O discurso cômico-humorístico é uma ferramenta interessante para o estudo da comunicação, visto que manifesta representações sociais sobre cultura, política, economia, ética, fenômenos psicológicos e fisiológicos entre outros aspectos. Os textos de humor apresentam um domínio lingüístico complexo, que envolvem o interlocutor em problemáticas de interpretação e trazem uma série de questões lingüísticas que as ciências da linguagem têm procurado responder na atualidade.
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Podemos analisar os textos humorísticos através de um referencial teórico baseado no discurso que entende o texto enquanto espaço de negociação de sentidos. Estas peças textuais geralmente acionam mais de um mecanismo lingüístico e posicionam o locutor frente à realidade, à imagem que faz de si e de outro, sempre partindo daquilo que enunciou ou deixou de enunciar.
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De acordo com Propp, os caracteres cômicos não existem por si só, eles têm relação com as atividades do homem no mundo social. Mesmo quando estamos rindo de um macaco em um zoológico, na verdade, não rimos do próprio animal, mas dos gestos que correspondem a determinados significados na coletividade humana. A identificação de uma atitude cômica ou humorística aponta para o reconhecimento de gestos sociais que rompem com uma conduta ideal. Para compreensão de textos humorísticos, é necessário que o leitor faça operações epilingüísticas, possua conhecimentos sobre a língua, sobre comportamento lingüístico que se espera de um sujeito em determinada situação e sobre o contexto em que se produziu o texto. Segundo Possenti, embora o texto não seja o único fator relevante no processo de leitura, é o ingrediente mais importante, pois é ele que demanda e limita a atividade do leitor.
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Podemos distinguir as fontes geradoras do riso em: o cômico de gestos e formas (que exploram o automatismo, o enrijecimento e deformações do corpo físico); o cômico de caráter (relativo à fraqueza moral ou ao temperamento contundente dos personagens); o cômico de situação (reprodução de cenas da vida que denotam desvios de comportamento moral dos sujeitos que representam as instituições sociais) e o cômico de palavras (organizado, predominantemente, em forma de jogo de palavras).
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Além da identificação dos aspectos físicos, sociológicos e psicológicos, que atuam sobre a comicidade, faz-se necessário investigar o funcionamento da linguagem na construção dos textos humorísticos. O humor, diferentemente do cômico, proporciona um riso que não está ligado exatamente ao que se diz, mas à maneira como um discurso é expresso em termos lingüísticos em uma dada situação. O texto humorístico não traz em si o sentido da comicidade, porém ele é, sobretudo, a condição básica para que o leitor construa o significado.


(EL FARO de Vigo – 10.04.2001)


HISTÓRIA DO HUMOR
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Para compreender a função social dos efeitos humorísticos, é interessante que se conheça os princípios que geraram a manifestação do humor em diferentes épocas do mundo ocidental, a partir da constituição de textos humorísticos na Antiguidade Clássica. Segundo Bakhtin (1999), a força das narrativas cômicas tem forte ligação com as tradições vivenciadas na Antiguidade por meio da carnavalização.
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Bakhtin buscou nos documentos e registros do mundo ocidental, momentos de afrouxamento das fronteiras entre o sério e o cômico, o oficial e o extra-oficial, nos eventos culturais no período de transição da Idade Média para o Renascimento. Em sua visão, esse período impulsionou novas formas de realização do riso, possibilitando o surgimento de novos gêneros textuais, inclusive o do romance.

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Através das festas populares foi possível desmoronar as fronteiras entre o sério e o cômico; o fantástico e o real. Durante a excentricidade destes eventos ocorre a proclamação da liberdade e a quebra da hierarquia de classes. Quem era rei assumia o papel de escravo e vice-versa. A inversão de papéis sociais permitia que muitas verdades fossem ditas em tom de brincadeira. Neste contexto, não há um único alvo de escarnecimento, todos os atores sociais são objetos de humor quando se encontram no cenário carnavalesco. Por esta razão, o carnaval assume uma forma de expressão que não visa emocionar, mas provocar o riso, representando as ações ridículas do homem. As festas profanas na Idade Média, toleradas pela Igreja, tiveram um papel fundamental na formação de novos textos que correspondiam ao espírito da carnavalização.

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O papel da paródia na Idade Média foi vital, pois ela preparou a nova consciência lingüística e literária, preparou o grande romance da Renascença. A Idade Média, com maiores ou menores restrições, concedia ao riso e à palavra cômica, direitos bastante amplos.
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ANÁLISE DE TEXTOS HUMORÍSTICOS
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Conhecimento Prévio – Intertextualidade
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E Eva disse a Adão: - Adão, você me ama?
E ele em sua infinita sabedoria: - E eu lá tenho escolha?
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A leitura deste texto está relacionada ao conhecimento prévio de outro texto: A história bíblica Adão e Eva no paraíso. Se esta relação não for identificada pelo leitor, o mesmo atribuirá ao texto um efeito de sentido diverso. Neste caso, a intertextualidade, ou seja, a ligação entre textos orais ou escritos, é um aspecto relevante do conhecimento prévio. A pergunta que Eva faz a Adão é comum entre casais, porém, a percepção de tratar-se do casal considerado a gênese da humanidade, modifica a compreensão do texto e torna-se mais apropriada, visto que provoca o riso. Adão, de fato, não poderia ter outra opção.
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Nível Fonológico
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Rubens Barrichello é um ás no volante.

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Esse texto pode ser lido de duas formas:

Rubens Barrichello é um ás no volante, ou Rubens Barrichello é um asno volante.
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A ambigüidade do texto, causadora do humor, é resultado da emissão da sílaba tônica na seqüência de sílabas que formam ás + no (= asno). Sendo possível obter em uma leitura, a palavra “asno” e, em outra leitura, as palavras ás e no, diferenciadas pela acentuação. Esta compreensão pode ser interessante quando se busca mostrar que a relação entre uma forma e um sentido não é tão óbvia.
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Nível Lexical

Neste exemplo, os sentidos da palavra “perua” são explorados para a produção do humor, que funciona com base na ambigüidade da palavra, nos dois sentidos que são veiculados pelo mesmo material verbal. A palavra “perua” pode ter acepções distintas como: a fêmea do peru, estado de embriaguez, prostituta, mulher que se veste espalhafatosamente, van, caminhonete, etc.
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Nível Morfológico
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Perguntaram ao português:
- O que é um homossexual?
Ele respondeu:
- É um sabão para lavar as partes.

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Segundo Possenti, a maior parte das piadas em nível morfológico inclui um problema fonológico. A distinção entre os dois níveis tem a função de destacar os domínios, privilegiando um de cada vez.
Na piada citada, no nível morfológico, de acordo com a separação feita na cadeia, temos mais ou menos palavras em questão, e isso é um problema de morfologia. Basta pôr em primeiro plano a formação de uma das seqüências (homo + sexual) ao lado de outra (homo + sexo + al) para que se evidencie o que foi exposto.
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Nível Sintático
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Duas pessoas caminham lendo lápides em um cemitério, quando se deparam com os seguintes dizeres: AQUI JAZ UM POLÍTICO E UM HOMEM HONESTO.

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O elemento causador de humor nessa piada decorre do fato de se ler a inscrição como um período simples ou composto. Quem fez a homenagem ao morto afirmou que ele, além de político, era honesto. A idéia de adição ocorreu com as qualificações de um mesmo ser. O que está escrito na lápide constitui um período simples. A leitura feita leva em conta a idéia de adição entre duas orações. Assim, temos coordenadas aditivas com a elipse do verbo na segunda: Jaz um político e (jaz) um homem honesto.
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É importante ressaltar o contexto que envolve esta piada e causa o humor; a concepção corrente de que todo político é corrupto, é compreendida pelo leitor, mesmo que não se compartilhe da mesma opinião.
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Nível Semântico
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Numa festa o secretário do presidente fila um cigarro. O presidente comenta:
- Não sabia que você fumava.
- Eu fumo, mas não trago.
- Pois devia trazer.
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O humor nessa piada constitui-se a partir da coincidência entre as duas formas verbais que provêm de verbos distintos: tragar e trazer. A forma trago (presente do indicativo) provém do verbo regular tragar e é do mesmo campo semântico de fumar o cigarro; mas o presidente compreende trago como o presente do verbo irregular trazer e censura o secretário por ser fumante e não estar portando cigarros. Seria mais coerente o interlocutor compreender a forma trago com a possibilidade de estabelecer uma relação com a ação de fumar (fumar equivale a fumo, tragar equivale a trago).
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O que provoca o humor é o “equívoco” provocado pela língua que gera uma coincidência que é mais relevante do que o fato de o presidente não censurar o secretário pelo vício de fumar.
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Dêixis
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- Não deixe sua cadela entrar na minha casa de novo. Ela está cheia de pulgas.
- Diana, não entre nessa casa de novo. Ela está cheia de pulgas.
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Dêiticos são formas lingüísticas cuja referência só pode ser determinada pelo contexto. A indeterminação de dêiticos é favorável para a produção de humor. Os pronomes pessoais, sob o ponto de vista dos pragmaticistas, estão submetidos a condições que ultrapassam um aparentemente simples contexto. Como se percebe na piada acima, o pronome “ela” é um dêitico, isto é, sua referência, no caso desse texto, depende do pressuposto que determina a ocorrência de um nome de referência idêntica, e que há dois sentidos possíveis: tanto “cadela” quanto “casa” podem ter referentes idênticos ao de “ela”, esses dois sentidos possíveis podem ser fonte de equívoco, o que possibilita a produção do humor nessa piada.
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Caricatura, Hipérbole e Grotesco
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De acordo com Bergson, o humor, além de ser um fenômeno social, é um fenômeno psíquico. O sujeito ri de situações constrangedoras com as quais não se envolve afetivamente. O cômico é provocado pela observação das falhas humanas em uma perspectiva corretiva, diante dos olhos do observador. O cômico estaria ligado à capacidade de explicitar e identificar o ridículo humano projetado no exagero caricaturado, na encenação do automatismo extremado, nos gestos de transgressões e nos clichês desgastados.
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Essencialmente, existem três formas de exagero que produzem o efeito cômico: a caricatura, a hipérbole e o grotesco:

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a) A caricatura teria a função de captar a falha imperceptível e ressaltar um pormenor que demarca um alvo de crítica. Entretanto, alguns pontos positivos sobre a imagem construída são resguardados.



b) A hipérbole é uma variedade da caricatura que ressalta exageradamente os aspectos negativos, não aproveitando nenhum aspecto positivo. Ela pode ser tanto heroizante como depreciativa.


c) O grotesco consiste na forma mais extremada de exagero; ele aumenta o alvo do relato em uma proporção monstruosa.



Com a finalidade de saber se o assunto foi compreendido por todos, o grupo separou alguns modelos de humor para que fossem interpretados e classificados conforme explicação em classe. Seguem os comentários da classe e respostas:

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Comentário: "Cômico de Situação e Palavras."


R: A resposta está correta porque a charge faz uma sátira ao time de futebol do Palmeiras que em 2003, estava disputando uma partida decisiva na cidade de Garanhuns (PE) que decidiria a volta da equipe à primeira divisão do Campeonato Brasileiro e, faz também um jogo de palavras.

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Comentário: "Cômico de Caráter, Situação e Palavras."


R: A resposta está correta pois, a piada fala sobre o temperamento contundente do personagem, reproduz uma cena dentro do fórum e faz um jogo com as palavras.





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Comentário: "Caricatura."


R: Correto! A caricatura é do ator Leonardo DiCaprio que interpretou o papel principal no filme "Titanic".







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Comentário: "Cômico de Situação. Charge"

R: A resposta está correta, porém acrescentamos o cômico de palavras. A charge faz uma sátira sobre os policiais chineses nas Olimpíadas que foram treinados para não autorizar determinadas imagens da imprensa e também faz um jogo com as palavras.


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Comentário: "Cômico de Situação, Nível Fonológico."

R: Resposta correta! Neste caso, a piada reproduz uma cena da vida no interior, satirizando o sotaque. Além disso, possui ambiguidade, provocando o humor. Acrescentaríamos o Cômico de Palavras pois, a piada também faz um jogo com as palavras.
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Comentário: "Grotesco."


R: Correto! A figura reproduz o exagero extremo, aumentando o alvo do personagem em uma proporção monstruosa.










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Comentário: "Cômico de Palavras e Cômico de Situação Corporativa."

R: Exato! Além do jogo de palavras, a charge reproduz uma cena muito comum no mundo corportativo.





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Comentário: "Cômico de Caráter, pois é difícil achar um político honesto pois todos prometem fazer e fazer, e nunca fazem nada."

R: Correto! Concordamos com a resposta pois, a charge refere-se ao caráter que a grande maioria dos políticos brasileiros possuem.





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Comentário: "Hipérbole."

R: Concordamos com a resposta pois a figura está aumentando alguns aspectos negativos do ator "Will Smith". (Não está em proporção monstruosa, eis a diferença com o ítem Grotesco)










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Comentário: "É um caricatura."

R: De acordo com nossa explicação em sala de aula "A caricatura tem a função de captar a falha imperceptível e ressaltar um pormenor que demarca um alvo de crítica". No nosso ponto de vista, esta é uma figura comum e que satiriza a expressão "Uai" utilizada pelos mineiros em conjunto com a palavra "Wireless" (internet sem fio). Devido a semelhança da pronúncia das duas palavras, acreditamos que a resposta correta seja: Cômico de palavras e nível morfológico.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

POSSENTI, Sírio. Os humores da língua: análises lingüísticas de piadas. 3ª ed. Campinas: Mercado de Letras, 2002.

Discurso, Estilo e Subjetividade. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

HENRIQUE, Ana Lúcia & PEREIRA, Francisca Elisa. Análise Lingüística de Textos Humorísticos: Uma Prática de Leitura e Cidadania. In: Holos-CEFET, Ano 15, Nº 01, Natal, 1999, p. 37-43.

ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de Discurso: Princípios & Procedimentos. 4ª ed. Campinas A LEITURA DOS TEXTOS DE HUMOR

José Ricardo Carvalho da Silva - 3° período, campus Niterói - manhã - Professor da Faculdade Maria Thereza (Pedagogia) e mestrando em Pedagogia

Site: www.iel.unicamp.br/cefiel/alfaletras/biblioteca_professor/arquivos/49Textos%20de%20humor.pdf

Esperamos ter esclarecido todas as dúvidas quanto ao tema "Textos Humorísticos".

Carla, Daniele Rosati e Karen.



5 comentários:

Anônimo disse...

Olá Meninas...

Parabéns pela apresentação, a cada sexta-feira que passa os grupos estão apresentando trabalhos de ótima qualidade.
Adorei os videos, além de ser uma ferramenta que nem todos os grupos estão utilizando, vocês tiveram o cuidado de escolher para não desviarem do conteúdo.
A dinâmica foi ligada ao conteúdo, porém fica uma dica para a próxima apresentação: "Acho importante que na finalização da dinâmica seja dado o feedback da mesma junto a sala".

Beijos

Andressa

Anônimo disse...

Professor cadê você!!!

Karina Helena disse...

Parabéns meninas!

A apresentação de vocês foi muito boa, mesclando humor e a coisa "séria", e o conteúdo do tema foi bem explorado.
Como disse a colega Andressa, a cada semana fica mais interessante as aulas de sexta.

Bjos à todos.

Karina Helena

Anônimo disse...

Achamos que a apresentação do grupo foi clara e o conteúdo do trabalho muito bem explorado, com diversos exemplos, o que facitou o entendimento para os alunos.

Parabéns ao grupo,

Claudia, Giselli e Viviane.

Anônimo disse...

Katty, não se desespere. Estou aqui, firme e forte.
Ainda bem que deixei para vir depois, porque economizo o verbo.
A Andressa e as outras moças já disseram o que eu queria dizer.
E vocês dizem que não são capazes de avaliar o que produzem.
Parabéns ao grupo e aos comentadores.

Roberto.